Guiné Bissau


Kassumai é a saudação da etnia dos felupes, que significa: “a paz esteja contigo, desejo tudo de bom e de melhor para você”.

Guiné-Bissau
Guiné-Bissau é um país localizado na costa ocidental de África, faz fronteira, ao norte com Senegal e ao sul e oeste com Guiné Conakri. Além do território continental, o país integra ainda cerca de 40 ilhas que constituem o arquipélago dos Bijagós. Foi uma colônia de Portugal, desde o século XV até à sua independência, em 1974, portanto a língua oficial é o português, porém é falado por apenas 2% da população, a maioria das pessoas falam o crioulo e dialetos tribais próprio de cada etnia. O território é relativamente pequeno possui uma população aproximadamente de 1 milhão de habitantes e desses 44% são crianças.



Diário de bordo

Realizar um sonho é sempre um caminho a percorrer e foi um sonho que me levou à África. Maio de 1998. Desembarquei pela primeira vez na Guiné-Bissau. Ainda no aeroporto e, depois, a caminho do lugar onde me hospedaria, comecei a me impressionar, para não dizer encantar, com o colorido do povo. Bastava olhar para as vestimentas daquelas mulheres com seus lenços e turbantes muito alegres, de traços puros e atraentes, carregando suas crianças em panos amarrados às costas e nas cabeças uma variedade de objetos para, de fato, confirmar minha primeira impressão.

O sonho foi interrompido pela guerra. Uma semana após minha chegada, uma tentativa de Golpe de Estado terminou eclodindo numa violenta guerra. Eu tinha ido passar o fim de semana em Suzana, norte do país, fronteira com o Senegal, passar o fim de semana, levando comigo apenas um par de roupas e a máquina fotográfica, nada mais... No domingo pela manhã, escuto pelo rádio que as fronteiras de Bissau estavam fechadas, ninguém podia entrar nem sair, os militares tinham tomado a cidade numa tentativa de golpe. Ficamos todos apreensivos e sem saber ao certo o que estava acontecendo, até que, em menos de 24 horas, a situação começou a se delinear: a chegada de um navio do Senegal e de um avião militar de Guiné Konacri com mais de 2000 soldados, tanques de guerra e uma série de armamentos pesados traziam a triste certeza do que estava por ocorrer. Tratava-se de uma guerra.

Após três dias de bombardeios e tiroteios infindáveis na capital, as pessoas começaram a fugir a pé, rumo ao interior e tendo que enfrentar bombas e disparos, como única forma de escapar com vida. De fato, era grande o número de pessoas atingidas pelo caminho, muitas feridas, tantas outras mortas. Nesse momento, eu, juntamente com alguns missionários, organizamos uma espécie de posto de saúde, onde atendíamos as pessoas que ali chegavam feridas e cansadas de tanto caminhar, com os pés machucados e sangrando, mulheres com crianças no colo e outras tantas ao redor já órfãs, todos sem comer, sem beber nada e com insolação.

Dava pesar o estado físico deles, imaginem o emocional. Grande era o pesar das perdas, grande era o número de parentes mortos que foram sendo deixados pelo caminho. Em verdade, é duro expressar uma experiência dessas, muito pior foi vivenciá-la. Não posso negar que aqueles dias foram de grande temor para mim, de grandes inquietações. Como saber se também eu conseguiria sobreviver? Há muita solidariedade nesses momentos, mas também há muitos que se aproveitam dessas situações em função de seus próprios interesses.

Basta citar os comerciantes que aumentaram os preços das mercadorias ou então daqueles que aproveitaram para roubar as casas que ficaram abandonadas em Bissau. O deslocamento das pessoas para o interior do país gerou uma crise generalizada, porque tanto as famílias de acolhimento como as deslocadas encontravam-se em situação de absoluta penúria: as famílias guineenses, devido à situação econômica do país, possuem baixo poder aquisitivo, o que não lhes permite criar estoque alimentar familiar. O pouco que as famílias de acolhimento possuíam, que deveria durar até a próxima safra, foi rapidamente consumido.


Durante três meses, fiquei refugiada no interior do país numa missão da igreja católica, mais precisamente do PIME (Pontifício Instituto das Missões Estrangeiras), com a esperança que a guerra terminasse para assim voltar à capital e recuperar meus pertences, principalmente documentos, passagem, dinheiro... Nesse tempo, ajudava naquilo que podia: no início nos organizamos para socorrer as pessoas que fugiam da capital (Bissau) onde acontecia a guerra, transportando-as para o interior do pais, dando refúgio, primeiros socorros, alimentação. Depois, junto com a comunidade, aproveitamos as mangas da época e confeccionamos quilos de doce (marmelada) para enviar aos refugiados. Sem perspectivas e com a guerra se agravando, consegui finalmente uma carona com os Médicos Sem Fronteiras até Dakar, capital de Senegal e de lá a Embaixada do Brasil me repatriou. Retornando ao Brasil, me sentia triste e impotente diante de tal acontecimento. Aqui chegando, percebi que a grande maioria das pessoas daqui não sabia de nada: era uma guerra não noticiada.

Guiné Bissau pós guerra

Em abril de 1999, assim que a guerra terminou, pois durou onze meses, me convidaram para voltar e trabalhar com CÁRITAS na reconstrução do pais. Meu trabalho consistia em organizar toda a ajuda humanitária que chegava do exterior, como medicamentos, gêneros alimentícios, roupas, material escolar. Após seis meses fui contratada pela UNICEF como fotografa, percorri todo o pais captando imagens de crianças e mulheres e todas as intervenções que ela realiza lá num período de cinco meses.

Na cidade viam-se muitas casas, escolas, hospitais em ruínas. Nas estradas, muitos tanques de guerra abandonados, ocupados pelas crianças como palco de suas brincadeiras. Sabiamos de 20 mil minas espalhadas pela cidade que continuavam a explodir, a assustar e, inclusive, a mutilar a população. A guerra provocou a morte de mais de nove mil pessoas e levou à fuga mais de 200 mil. As pessoas retornavam ao lar, tentando recomeçar a vida. Não parecia ser um momento fácil. A tensão ainda estava presente no ar. Politicamente, a situação não se encontrava totalmente definida, o que causava insegurança nas pessoas de terem que, a qualquer momento, fugir novamente.

Conversando com as pessoas, ficava admirada com seu otimismo para lidar com essa e com suas tantas outras situações cotidianas. Até hoje, me questiono se seria essa postura fruto de uma história marcada, onde é preciso, de alguma forma, aprender a suportar e, também, a lutar. O trabalho era difícil porque os recursos eram escassos. Os meios de transporte eram precários e as distâncias bastante grandes. Energia e água era raridade. A comunicação entre eles se dava através de um rádio popular. Era, de fato, através dele que recados particulares chegavam ao seu destino.

Compartilhar de uma realidade tão distinta da sua é uma escola diária. É como se nesse momento, seus valores, seu modo de vida, suas metas e certezas se misturassem como numa brincadeira de ficção e você sentisse mudar seu centro. Esse processo, eu o chamaria de reencontro: é uma experiência bastante dura, implica sofrimento, que foi também um palco de batalhas internas. Estar lado a lado dele, senti-lo no outro e, tantas vezes, nada mais poder fazer do que dar a simples presença é algo constrangedor e angustiante.


Vivências compartilhadas

Durante esse período tive a oportunidade de conviver com as pessoas e vivenciar muitos de seus ritos e acontecimentos. Falar da cultura de um país com mais de 35 etnias é praticamente impossível, da mesma forma tem que se ter esse cuidado quando se fala da África, continente formado por 54 paises. Poderia escrever detalhadamente sobre cada um dos cinco funerais de etnias diferentes que presenciei ou casamento, ou tantas outras cerimoniais, entretanto, me propósito aqui é trazer o que elas tem em comum sem nenhuma pretensão de generalizar.

As principais atividades econômicas giram em torno da agricultura de subsistência, pesca, silvicultura e comércio. Considerada uma das 20 nações mais pobres do mundo (PIB per capita de US$ 160 dólares). Dependente de ajuda econômica externa, principalmente de Portugal. As principais exportações são de caju, madeiras e camarão. Há depósitos de petróleo, bauxita e fosfatos inexplorados devido à pouca infra-estrutura. A moeda é o Francos CFA (Franco da Comunidade Financeira Africana).

O ano se divide em duas estações: tempo de chuva e tempo seco. No começo das chuvas os homens preparam a terra, preparam as "bolanhas" (arrozais) - vários montes de terras recortadas ao meio a fim da água ficar acumulada para quando a chuva terminar; e as mulheres plantam o arroz, replantam, cuidam do arrozal durante meses e no tempo seco recolhem, carregam cestos imensos na cabeça até a casa para depois pilar e armazenar para o ano inteiro.

É muito duro o trabalho que fazem principalmente que os campos ficam distantes de onde moram (2 a 4 km), as mulheres passam praticamente o dia inteiro agachadas (encurvadas) plantando e replantando o arroz, e muitas vezes com os filhos nas costas, se a criança ainda não caminha são obrigadas a ir junto. As crianças também possuem seu papel, são responsáveis de cuidar para que nenhum animal principalmente os macacos estraguem a plantação além de ajudar a carregar e pilar para separar a casca do arroz.
A mulher guineense no meio rural desempenha através de seu trabalho um importante papel na economia familiar. Para ela o dia começa cedo e logo ao cantar do galo dão inicio às múltiplas tarefas programadas para a jornada. Quando a família é poligâmica é a mulher mais velha a dona da casa que faz, no dia anterior, a distribuição das tarefas para as outras. É ela quem busca a água e a lenha, quem pesca e recolhe as frutas, quem espreme o caju para a extração do sumo (que quando fermentado, se transforma em vinho), prepara o óleo de palma, faz a cestaria e a cerâmica, entre outras. O alimento básico é o arroz e a ele acrescentam o peixe ou a carne de caça, costumam criar gado, galinhas, porcos, cabras, porém não é permitido sacrificar os animais sem que haja alguma cerimônia, funciona inclusive como uma espécie de banco, com estes animais eles pagam os dotes da noiva e trocam por outras mercadorias.

Na realidade, não há fome, mas sim, desnutrição causada pela dieta pouco variada. Muitas vezes, a desnutrição é um problema cultural. Mariama, uma moça de 20 anos, tinha um bebê que com seis meses pesava 1,6 kg. Ela não lhe dava de mamar porque dizia que seu leite era ruim, que se ele o tomasse, morreria. Quem diz se o leite é ruim ou não é o curandeiro, que durante a gravidez tira um pouco de leite do peito da mulher, o coloca num copo e joga uma formiga dentro. Se ela morre o leite é ruim, se viver, é bom e neste segundo caso é permitido dar a criança, caso contrario a mãe terá que encontrar outra mulher para amamentar seu filho ou usar leite de caixa. A má alimentação os deixa fracos e sem defesas para combater as doenças. Há muitos casos de malária, hepatite, meningite, tuberculose, hanseniase, AIDS. De cada oito crianças, cinco são soropositivas, mas a malária continua sendo a causa do maior número de morte.


Educação

Antigamente as meninas não tinha o direito de freqüentar a escola, isso era para os meninos, elas deveriam ficar em casa ajudando a mãe e preparando-se para seu marido, hoje já mudou bastante, há muitos programas que incentivam e apóiam as "raparigas" para que elas também sejam alfabetizadas. Somente no interior dependendo da etnia que ainda essa mentalidade prevalece.

Muitas escolas são bem precárias, no interior encontrei escolas construídas apenas com bambu, parede, banco e mesa e o teto de palha. Na cidade em alguns bairros as escolas são improvisadas muitas vezes no jardim da casa da professora, uma imagem bem característica é ver as crianças carregando o seu banquinho sobre a cabeça no caminho da escola, eles levam e trazem de volta para casa todos o dias, e sobre as pernas apóiam o caderno onde irão rabiscar suas primeiras palavras.

Um dos problemas que enfrentam é o fato das crianças aprenderem em casa a falar na língua étnica e em crioulo, e na escola são alfabetizadas em português, imaginem que muitas vezes o professor ensina numa língua e explica na outra, esse foi um dos motivos que prejudicou Paulo Freire quando esteve lá intentando implantar a sua pegadogia, mais detalhes podem ser lido no seu livro: “Cartas a Guine Bissau”.

A transmissão da cultura se dá sempre através de contos, provérbios ou lendas que se referem aos acontecimentos vividos nos tempos antigos. Constata-se facilmente que a tradição dos antepassados está muito presente na vida do povo, haja visto que, para o africano, é o passado que dá sentido ao presente. O futuro ainda não existe. Diz o poeta Hampaté Bah, do Mali: “Quando morre um africano idoso, é como que se queimasse uma biblioteca”. Esta frase exprime bem o valor que tem o idoso na sociedade tradicional africana, que tem uma cultura iletrada. O idoso, com a sua sabedoria adquirida nos seus muitos anos de vida, torna-se o transmissor dos valores da cultura tradicional herdada dos seus antepassados.

Ritos

O africano, de modo geral, enfatiza os grandes momentos da vida: o nascimento, a iniciação a vida adulta, o casamento, a doença e a morte. Todos estes aspectos da vida são manifestados através de ritos especiais que varia de etnia para etnia, passando desde a diferença lingüística, a dança, a expressão artística, a profissão, a tradição musical até as manifestações culturais.

O Fanado, rito de iniciação a vida adulta, é uma pratica realizada nos rapazes (ablação do anel prepucial) em algumas etnias também o nas meninas (extirpação do clitóris). Embora realizado em todas a etnias da Guiné Bissau, este ritual costuma variar entre elas (a idade dos participantes, a cada quanto tempo é realizado, o tempo de duração, entre outros). No fanado, o indivíduo toma consciência de sua personalidade e de sua posição na sociedade, sua integração se dará por meio do rito. É ele que confere ao indivíduo o "status" de adulto .

A maioridade não é uma situação que se alcance pela idade, em casa, no ambiente familiar, mas em pleno mato desligado da família, integrado no grupo sujeito à mesma cerimônia. A iniciação é um processo de integração sócio-cultural e religiosa necessária para a vivência nas comunidades É um ritual complexo: geralmente, os ou as iniciantes são isolados na floresta ou em cabanas à margem da aldeia, onde ninguém podem entrar, e aí são preparados para a vida adulta, ecebendo ensinamentos sobre as tradições locais e ao sair não se pode falar absolutamente nada do que se passa lá dentro.

Manifestam sua religiosidade através de orações, danças e sacrifícios aos espíritos. Para os animistas, a morte é um prolongamento da vida, sendo vivida em outras dimensões. Se o morto teve uma longa vida, o seu funeral é motivo de regozijo e ele se tornará um espírito de proteção. A vida é fruto do equilíbrio entre todas a forças materiais e espirituais. Se esta harmonia se rompe, seja pela quebra de algum tabu, tradição ou ritual, os espíritos se vingam com doenças, morte do transgressor (culpado) e desgraças para toda a tribo.

Este fato apavora por demais os nativos, que criam rituais para prevenir esta vingança. Os cantos, as danças até a exaustão física ou o transe são formas de descarregar toda esta tensão causada pelo medo. Para eles, o homem nasce, vive e quando morre vai para o "país dos mortos", onde se encontra com seus ancestrais. Caso tenha sido em vida, um homem de bem, logo entra nesse país e encontra a felicidade. Caso, não, seu espírito vaga sem paz na floresta até pagar sua culpa. Os mortos permanecem em estrito convívio com os vivos, ditando-lhes, do mundo do além, as normas de conduta geral e o procedimento a adotar.

A poligamia é muito comum na África e a relação entre as esposas é sempre muito harmoniosa e se ajudam mutuamente. Na verdade é até desejado por elas que seu marido case com outras para ajudar nos deveres da casa, sendo a primeira mulher que possui a maior autoridade é ela quem escolhe as próximas mulheres de seu marido e divide os deveres.

CASAMENTO da etnia BALANTA: relato um dos casamentos que participei na cidade de Mansoa. A moça tinha 15 anos e não conhecia o noivo, o casamento tinha sido arranjado pelo seu tio e pai do noivo. Em geral paga-se um dote que equivale a alguns animais de criação. Depende do valor que é dado à moça. A cerimônia começou às sete da manhã. Os parentes já haviam passado a noite inteira em festa.

Dentro da casa a noiva recebe os conselhos das "mulheres grandes" (as mais velhas), conselhos estes, que ensinam como deve comportar-se, seus deveres e direitos de esposa. A noiva sai às dez da manhã e é levada a um "barraco" onde as 'só as mulheres grandes entram e primeiramente raspam seus cabelos, dão banho na noiva, a seguir a envolvem com um tecido branco e outro azul. Ao terminar ela retorna para dentro da casa toda coberta para que ninguém a veja. À tarde se dirige até a porta, onde um "homem grande", do lado de fora, faz toda uma cerimônia que se chama "casamento na porta". Os casamentos são realizados geralmente entre pessoas da mesma etnia.


FUNERAL da etnia BALANTA: Num dia pela manhã escuto de longe o som do "Bombolom", tambor tocado sempre que alguém morre, ele anuncia e chama as pessoas para o velório do corpo, pode ser ouvido a km de distancia. Me aproximo e consigo entrar na casa onde estavam velando o corpo da falecida: “mulher grande”, ela estava deitada sobre uma esteira no chão, assim dormem a maioria dos africanos, havia uma vela em cada canto e muito incenso. Do lado de fora, todos bebiam e dançavam. Algumas mulheres preparavam dois chapeis (uma cabaça enfeitada de missangas) um para ser enterrado com a morta, e outro para a filha mais velha que usará durante um mês como sinal de luto.


Os homens cavam o buraco na varanda da casa onde será para enterrada. O buraco tem a forma de L, e o corpo ficará na parte inferior horizontal, de maneira que ao jogar a terra para fechar o buraco, a terra não caia sobre ela. A medida que as pessoas chegam a o baile fica mais animado, todos dançam e bebem. Ao cair o sol, vestem a morta, com a melhor roupa, jóias, adornos e o chapéu, a envolvem nos tecidos que cada parente trouxe, acreditam que o morto levará os tecidos aos outros que já partiram desta vida. Transladam o cadáver embrulhado fora da casa e o colocam no chão, é hora que todas as crianças pulem por cima dele três vezes, acreditam que assim sonharão com a morta, sendo uma maneira recordá-la sempre. Não acreditam na eternidade, para eles a morte é um mistério que respeitam e temem.

FUNERAL da etnia BIJAGÓS: uma mulher grávida tinha falecido no dia anterior, motivo: sabe-se que ela estava doente e procurou um djambacós (curandeiro) para saber a causa, e este lhe falou que alguém tinha lhe tirado sua alma, pois não gostava dela pelo fato de possuir muito arroz, estava com inveja, assim contam!!? Na cerimônia pretendia-se descobrir se aquilo que o feiticeiro falava era verdade. Durante o velório os “homens grandes” (balabeiros) se reúnem para saber o que causou a morte da mulher. A cerimônia se realiza numa tabanca (aldeia) é lá que fica o Irã Grande (representação da força divina), chamado de Irã do chão, é o mais poderoso da tabanca, para além da forma humana, ele pode assumir outras formas.

Colocam a representação do Irã (escultura de madeira) no pátio, junto ao cadáver ou maca representando ele. Uma pessoa traz uma cabaça com água ou águardente, dependendo do irã, predicando frases como esta para a morta: “....eu estou derramando esta água fria, pedindo a Deus para que tua alma também esteja fria (sinônimo de céu), esperamos que tu fales tudo sobre a tua morte......” logo colocam a cabaça ao lado do Irã e do cadáver, esta cabaça simboliza uma geração da família. Em seguida matam um pintinho, cortam sua cabeça e o jogam no chão na frente do Irã, este irá conduzi-la para indicar o que levou a morte, o corpo do pintinho começa a pular até parar. Caso toque na cabaça significa que a morte provém da família.



Geralmente a morte quando provém da família é devido a alguma cerimônia que a família não tenha realizado, não cumprindo com alguma promessa ao Irã. Se toca em alguma pessoa presente na cerimônia significa que esta pessoa é responsável pela morte, então se faz outra cerimônia para fazer vingança a esta pessoa. Se não toca nem na cabaça nem em ninguém é porque chegou a sua hora, é de Deus. Após a cerimônia é coletado dinheiro para ajudar a família nas cerimônias posteriores onde acontece o sacrifício de animais, para derramar o sangue (sua explicação é a mesma do Antigo Testamento)
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"CHORO" (funeral) da etnia FELUPE: Neste ritual, elas vestem e sentam a morta “mulher grande”, numa espécie de altar construído especialmente para ela. A melhor amiga sentará ao seu lado, abanando as moscas com uma folha de palmeira. Participam todas as mulheres do vilarejo. As parentes raspam o cabelo e se banham na lama como sinal de dor, de luto. De fato, elas choram durante a manhã, conversando, relembrando e até mesmo julgando a vida da morta. Á tarde chegam os homens com seus tambores e começam a dançar até o pôr do sol, quando então é enterrada envolvida em tecidos doados pelas parentes. As bebidas alcoólicas também não podem faltar, em especial o vinho de palma e de caju.

Em fim, o sonho virou realidade, as experiências vividas na África despertaram em mim o desejo de cada vez mais conhecer outros povos, outras culturas e registrá-los como forma de, também, poder dividir com outras pessoas aquilo que trago em meu coração. Hoje, posso dizer, minha existência traz as marcas daquele colorido africano.